Liberdade Expressiva
A Fotografia como Reflexo do Momento.
A fotografia, para muitos, é a procura incessante de um estilo, de uma assinatura visual que se torna marca autoral. Para outros, como eu, a fotografia é antes de tudo uma linguagem plástica e emocional, moldada não por rótulos ou correntes estéticas fixas, mas pela minha disposição no momento e pela atmosfera do lugar onde fotografo. É nesse espaço fluido, onde a intuição e a liberdade se sobrepõem à categorização, que nasce a minha prática fotográfica.
Não me prendo a estilos definidos. A minha abordagem é movida pelo impulso do instante, pelo estado de espírito que me habita no momento de levantar a câmara e pelo modo como o ambiente se revela — seja uma paisagem natural envolta em silêncio, uma rua movimentada de uma cidade, ou uma cena inesperada num espaço qualquer. Esta flexibilidade formal é uma forma de fidelidade não ao estilo, mas à verdade do sentir.
Ao longo da história da fotografia, diversos movimentos serviram de moldura para o pensamento visual dos seus praticantes. No entanto, eu transito entre eles, aproprio-me dos elementos conforme o propósito expressivo da imagem.
Há momentos em que o meu trabalho ecoa o Pictorialismo, movimento de finais do século XIX e início do século XX que procurava elevar a fotografia ao estatuto de arte, aproximando-a da pintura. Tal como Gertrude Käsebier ou Robert Demachy, pode optar por uma estética suave, onírica, usando desfoques, granulação ou manipulações na pós-produção para criar atmosferas introspectivas ou nostálgicas.
Noutras ocasiões, aproximo-me do Surrealismo, explorando o inconsciente e a imaginação. Assim como Man Ray ou Dora Maar, posso recorrer à sobreposição de imagens, à solarização ou à composição insólita para expressar estados interiores, dúvidas, desejos ou visões fragmentadas da realidade.
Quando o espírito pede leveza, posso ceder ao impulso Impressionista, evocando luz, movimento e cor através de técnicas como o ICM (Intencional Camera Movement) ou longas exposições. Aqui, como nos quadros de Monet ou nas fotografias de Ernst Haas, a imagem não descreve, mas sugere; não é nítida, mas sensorial.
Num outro registo, posso alinhar-me com o Modernismo Fotográfico, com composições formais rigorosas, exploração da geometria, contraste e abstracção, como o faziam László Moholy-Nagy ou Paul Strand. Nestes momentos, a fotografia torna-se quase construtivista, desvelando ritmos e estruturas invisíveis na realidade comum.
E há também ocasiões em que, despojado de artifícios, procuro apenas a verdade visual do mundo, num gesto próximo da Straight Photography ou fotografia direta. Influenciado por mestres como Edward Weston, Ansel Adams ou Henri Cartier-Bresson, não assumo uma linguagem clara, precisa, em que a beleza está na pureza da forma e no instante decisivo.
Esta liberdade de transitar entre linguagens, de escolher a técnica conforme o sentir, é o que define a minha prática. Não se trata de indecisão ou dispersão, mas de uma postura estética profundamente coerente com uma visão da fotografia como meio de expressão sensível e pessoal. Cada imagem é uma resposta única ao que vivo e observo; é uma tentativa de tornar visível um estado interior em diálogo com o mundo exterior.
A minha única preocupação constante é expressar através da fotografia a minha leitura do motivo — seja ele uma árvore solitária, uma sombra numa parede, o pico enevoado de uma montanha, uma figura humana anónima ou um rasto de luz no céu ou na cidade. Ao abdicar de uma estética fixa, ganha-se liberdade para que cada fotografia seja singular, refletindo não apenas o que vi, mas como se senti aquilo que vi.
Neste ensaio visual em construção contínua, que define a minha fotografia, não há um estilo — há apenas uma voz. E essa voz muda, como mudam os dias, os lugares e os estados de alma.